segunda-feira, 28 de julho de 2008

Ideologia - o que é isto? (baseado na leitura do livro da Marilena Chauí - "O que é ideologia")

Oi pessoal, vamos fazer uma pequena pausa em "A República" para publicar uma discussão sobre ideologia.

Eu disse em outro fórum:
... estou lendo o livrinho da Ideologia da Chauí. Ainda não terminei porque empaquei num ponto: ela diz que há uma separação entre o detentor do capital e o trabalhador assalariado; este tem parte do seu trabalho não remunerada - a mais valia - que vai justamente engordar o capital e fazer girar o sistema. O que me chamou a atenção é que hoje em dia, nas empresas S/A vc não tem a figura do capitalista, vc tem uma pulverização do capital... aliás não é incomum que o acionista também seja um assalariado, o que significa que as divisões em classes, e consequentemente a luta de classes está ficando muito esquisita, pois a mesma pessoa pode estar dos dois lados e brigando por objetivos conflitantes...Como assalariada ela vai brigar por mais salário, menos trabalho... como acionista ela quer mais lucro...Como isso é possível? Será que alienação atingiu tal tamanho que a pessoa não perceba que está numa contradição?
Outra coisa que sempre me vem na cabeça é que se os acionistas querem sempre mais lucro, ano após ano...E todas as empresas fazem a mesma coisa...E os recursos são finitos....E há um limite para a pobreza...senão vc vai matar o seu próprio consumidor....então este sistema vai entrar em colapso mais cedo ou mais tarde...é inevitável...o que virá em seguida?
Bjs!!!

O Mauro Berimbau me respondeu:
...ela (a Marilena Chauí) diz que há uma separação entre o detentor do capital e o trabalhador assalariado; este tem parte do seu trabalho não remunerada - a mais valia - que vai justamente engordar o capital e fazer girar o sistema...[...] "O que me chamou a atenção é que hoje em dia, nas empresas S/A vc não tem a figura do capitalista, vc tem uma pulverização do capital... aliás não é incomum que o acionista também seja um assalariado, o que significa que as divisões em classes, e consequentemente a luta de classes está ficando muito esquisita, pois a mesma pessoa pode estar dos dois lados e brigando por objetivos conflitantes..."[Mauro] Acho que é por isso que a frase da Chauí está em um livro com nome "ideologia". Ela funciona tão bem, mas tão bem, que todos acreditam cegamente nela. Essa "crença cega" é como se fosse um sonho... as pessoas não despertam! Até mesmo quem a construiu sonha esse sonho. É mais ou menos essa a idéia de um autor que li recentemente chamado Dietmar Kamper.Ele fala a respeito de um espírito, o espírito dos homens, que considera sendo a soma de todas as imaterialidades, símbolos e signos que existem na mente humana. Por exemplo, uma árvore, nas nossas cabeças, não é uma árvore de verdade, porque uma árvore de verdade não cabe nas nossas cabeças. O que cabe é a imagem, o signo, o símbolo de árvore. O signo "árvore" é interpretado por você, mas também é interpretado por outras pessoas. Esse signo, essa imaterialidade, é o que cabe na cabeça de todos, e é o que permite a comunicação. Kamper então chama a soma de todas as imaterialidades, de símbolos dos homens, de "espírito".Nas sociedades midiáticas, esse "espírito" é reproduzido pela máquina, pelos "suportes maquínicos" - pela TV, pelo jornal, pelo rádio, pelo computador... Mas quando esse espírito se apresenta pela máquina, não é o mesmo espírito. É uma imagem idealizada. É a materialização do espírito humano através da máquina. Por exemplo: a árvore no desenho animado não é a árvore, mas é a materialização do símbolo "árvore". Assim é também o super-homem, uma materialização de uma parte do espírito humano. Uma construção que se apresenta através das máquinas e que lhe confere materialidade.Essas máquinas, então, realizaram um sonho arcaico do espírito humano: "de estar o tempo todo em toda parte e em nenhum lugar". Afinal, esse espírito não se apresenta como algo que teve um começo, porque isso seria atestar que teria um fim. Ele se apresenta como algo que sempre existiu, que sempre existirá. Sempre foi assim e sempre será. Não parece com uma ideologia? Esse espírito, por se apresentar como imortal e ser onipresente (não detalharei isso aqui, mas tenha como exemplo a divertida caçada por McDonalds que fazemos quando vamos para outros países) se apresenta como um Deus.Daí surge a figura que Kamper descreve, onde diz "Deus sonha os homens - os homens sonham as máquinas - as máquinas sonham Deus". - "Deus sonha os homens": Esse deus, esse conjunto de imaterialidades do espírito materializadas através da máquina, sonha o homem. Cria ele. O constrói. Apresenta o homem como ele foi, como ele é e como ele será. É através do Deus que vemos como foi o homem do passado no History Channel e como será o homem do futuro em Star Trek. Mas ele apenas "sonha" os homens, porque não o apresenta como é.- "Os homens sonham as máquinas": Porque é através delas que ele persegue o seu desejo de poder, de conquista, se armando até os dentes de máquinas. As máquinas são as criações do homem que deseja ser Deus. Sonhamos a máquina que nos fará viajar pelo espaço, nos comunicar e nos transportar livremente. O homem apenas "sonha" as máquinas, porque não as constrói como as realmente deseja.- "As máquinas sonham Deus": é pela maquinaria midiática que esse espírito se revela, que o Deus se materializa. Star Trek, a novela da Globo e o noticiário das 8 fazem parte da mesma materialização do espírito do homem, que só é possível porque a máquina permite. Ela apenas sonha o Deus, porque não o apresenta em sua totalidade.A idéia de sonho, aqui, se contrapõe ao "despertar". Todos nós, homens, máquinas e Deus, vivemos em sonho. Kamper acredita que não há como despertar."Como assalariada ela vai brigar por mais salário, menos trabalho... como acionista ela quer mais lucro...Como isso é possível? Será que alienação atingiu tal tamanho que a pessoa não perceba que está numa contradição?"[Mauro] O que você chama de alienação, Kamper parece chamar de Deus - talvez seja um resultado da ação dele. Chauí chama de ideologia (que funciona exatamente porque todos acreditam nela, até seu criador) Talvez isso não seja uma contradição, porque estão todos vivendo o mesmo sonho, o sonho da imagem, da construção imagética que dá corpo aquilo que é imaterial e que forma homens sem espírito."Outra coisa que sempre me vem na cabeça é que se os acionistas querem sempre mais lucro, ano após ano...E todas as empresas fazem a mesma coisa...E os recursos são finitos....E há um limite para a pobreza...senão vc vai matar o seu próprio consumidor....então este sistema vai entrar em colapso mais cedo ou mais tarde...é inevitável...o que virá em seguida?"[Mauro] Eu já ouvi você fazendo essa pergunta várias vezes. É algo que te perturba de verdade... hehehe. Talvez por conviver com pessoas que jogam esse jogo todo dia, que lutam para que "as empresas", expressão que nada mais é que uma materialização do Deus, continuem sonhando o seu sonho. "Será que dá pra despertar do sonho?" é a versão esperançosa da sua pergunta "o que virá em seguida?". Em Matrix, desperta-se do sonho. E como é o despertar? Morpheus responde Neo com um "welcome to the desert of the real"...
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Muito interessante, não é mesmo? :o)

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